Análise de Julio Beltrão, sócio de EGS Advogados.
A Lei 13.467/17, que instituiu a Reforma Trabalhista, entrou em vigor no dia 11 de novembro de 2017. A legislação modificou mais de 200 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com a promessa de gerar mais empregos e reduzir a informalidade.
No mês em que a Reforma Trabalhista alcança a marca de 5 anos, confira as considerações de Julio Beltrão, sócio de EGS Advogados, que fez um balanço das mudanças provocadas pelas novas regras de trabalho, bem como sobre as expectativas de possíveis alterações pelo próximo governo:
– A Reforma Trabalhista foi implementada com o objetivo de aumentar a geração de empregos e reduzir a informalidade. Após 5 anos, qual é a avaliação que você faz dos impactos desta legislação nas relações de trabalho? Quais são os avanços alcançados e o que deve ser reavaliado, na sua opinião?
Embora tenha sido anunciada por alguns como uma legislação que fomentaria a geração de empregos – o que, sabidamente, depende mais do crescimento econômico do país do que da vontade do legislador, entendo que os principais objetivos alcançados pela reforma trabalhista tenham sido a flexibilização de alguns aspectos da relação de trabalho – o que foi muito importante para a preservação de empregos durante a pandemia – e a segurança jurídica sobre temas que há anos geravam controvérsia na Justiça do Trabalho.
Nesse sentido, destaco três modificações importantes trazidas pela reforma e que foram referendadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da chamada “pauta trabalhista”, em meados de 2022: a inconstitucionalidade da ultratividade das normas trabalhistas, a prevalência do negociado sobre o legislado, desde que preservados os direitos indisponíveis, e a desnecessidade de autorização prévia dos sindicatos para a dispensa coletiva, sem prejuízo do dever de negociar.
Outro objetivo importante da reforma trabalhista estava relacionado à redução do número de ações trabalhistas que ingressam todos os anos na estrutura do Judiciário. Se em um primeiro momento foi possível experimentar uma diminuição significativa no número de ações ajuizadas pelos trabalhadores, esse quadro já não é mais o mesmo. Importantes dispositivos da reforma que serviram para inibir o ajuizamento das chamadas lides aventureiras, como a obrigação de pagamento dos honorários periciais e advocatícios pelo beneficiário da justiça gratuita que for sucumbente na ação, ou a obrigação de liquidar os pedidos da inicial, passaram a ser relativizados pela Justiça do Trabalho e pelo próprio STF.
No mais, considero que a celeuma em torno da possibilidade de terceirização de atividade-fim foi resolvida pela reforma trabalhista. Por outro lado, remanescem os riscos de vínculo empregatício quando presentes as características da relação de emprego, ou de responsabilidade das empresas tomadoras pelo inadimplemento das verbas trabalhistas por parte dos prestadores de serviços, notadamente quando restar comprovada a inidoneidade econômico-financeira da empresa terceirizada. Daí a importância de as empresas implementarem uma correta gestão de riscos trazidos por terceiros por intermédio de auditoria, com acompanhamento periódico da evolução do grau de risco de fornecedores nos âmbitos jurídico, financeiro e reputacional, desde a contratação até a rescisão contratual.
– O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que não irá derrubar a Reforma Trabalhista, mas que vai atuar para “revogar alguns marcos regressivos da atual legislação”, com o objetivo de adequá-la à realidade. O que podemos esperar desse novo governo em relação às leis trabalhistas?
O presidente Lula se elegeu a partir da construção de uma frente ampla de apoio, constituída por políticos de centro e centro-direita, o que só foi possível a partir dos acenos que fez ao mercado sobre diversos temas que interessam a economia e ao empresariado, como por exemplo o compromisso de não revogar a reforma trabalhista. Ajustes pontuais sempre serão bem-vindos, porém, qualquer modificação muito profunda enfrentará forte resistência no legislativo que, a partir das últimas eleições, formou maioria mais à direita, além de não encontrar apoio político em sua base ampla.
Um tema importante suscitado no plano de governo do presidente eleito diz respeito à necessidade de regulamentar novas formas de trabalho, como o trabalho em plataformas digitais, exercido em sua maioria por motoristas de aplicativos e entregadores de mercadorias. Encontram-se em trâmite no Congresso Nacional diversos projetos de lei que trazem em seu bojo os conceitos fundamentais que distinguem esta modalidade de trabalho das demais: o trabalhador tem liberdade de escolher seu horário de trabalho, de conectar-se e desconectar-se quando quiser e não sofrer qualquer tipo de penalidade ou consequência remuneratória em face disto.
De fato, a condição dos trabalhadores em plataformas digitais merece um olhar atento e não prescinde da necessidade de se criar mecanismos de inclusão que garantam a obtenção de benefícios presentes e futuros, tais como renda mínima, limitação da jornada de trabalho, férias e décimo terceiro, além de proteção previdenciária e contra acidentes, acompanhada de uma fonte de custeio para a conta fechar. Acredito que a regulamentação da matéria seja consenso entre os diversos atores políticos, e deve ser entabulada pelo próximo governo. Porém, trata-se de um tema complexo, pois a garantia de proteção social não poderá onerar demasiadamente as empresas do setor nem a previdência.
Por fim, acredito que a reforma sindical seja um tema a ser pautado pelo governo Lula. O fim da contribuição sindical obrigatória, pela reforma trabalhista, não veio amparado por outro modelo que sustentasse a estrutura sindical. Se de um lado a reforma privilegiou o negociado sobre o legislado, dando mais autonomia e poder para os sindicatos, ao tornar a contribuição sindical facultativa, acabou por causar um problema de custeio. Provavelmente, haverá debate em torno de uma possível reformulação da contribuição sindical. O modelo antigo de pagamento obrigatório não deve voltar, mas há que se buscar um meio de financiar os sindicatos, talvez por contribuição negocial aprovada em assembleia pelos trabalhadores.